Fonte: HBR Brasil
Um dos autores do artigo “Como a inovação aberta pode ajudar em tempos difíceis”, Henry W. Chesbrough esteve no Brasil em 22 de outubro durante um evento promovido pela empresa brasileira Allagi, especializada em inovação aberta. Esta foi sua segunda visita ao País. Na primeira, no ano passado, também a convite da Allagi, o especialista lançou a semente para a criação do Open Innovation Center do Brasil (centro de inovação aberta do Brasil). Lançado oficialmente em maio deste ano, o centro brasileiro é uma espécie de filial do criado por Chesbrough na Haas School of Business, da University of California em Berkeley, nos EUA, onde ele é professor e pesquisador. Aqui, Chesbrough assumiu neste ano o posto de chairman tanto do centro quanto da Allagi. Leia abaixo a entrevista exclusiva concedida pelo professor à HBR Brasil, sobre as oportunidades de inovar abertas às empresas brasileiras.
Que conselhos o senhor daria hoje aos líderes das empresas brasileiras sobre inovação aberta?
No Brasil não houve uma crise financeira como nos Estados Unidos e na Europa. A boa notícia, claro, é que não teve crise; a má notícia é que talvez haja menos urgência de inovar e mudar. Então, eu acho que, para o Brasil, o importante é não se tornar complacente; as coisas estão bem, mas precisam continuar a prosperar, para não ficar para trás. Os concorrentes se tornarão mais fortes globalmente quando saírem dessa recessão realmente difícil, o que significa que a competição global será mais acirrada daqui para frente. Então, acho que as empresas brasileiras devem aproveitar o momento para se tornarem mais e mais internacionais, exportar mais tecnologias criadas aqui no Brasil, e também para se tornarem parte da comunidade global de inovação, dividindo e colaborando com empresas tanto no País quanto fora.
Este é o objetivo do Open Innovation Center Brasil: ajudar as empresas brasileiras a se engajarem neste movimento?
É um deles. Acho que o primeiro de todos os objetivos é fomentar uma compreensão maior sobre inovação aberta nas universidades e escolas de negócios brasileiras, e ajudar a criar uma comunidade acadêmica para estudar inovação aberta, pesquisar onde ela existe e já funciona, onde não vai tão bem, identificar exemplos no Brasil que estejam mostrando que pode ser mesmo útil e efetiva, e dividir com outras empresas. Com isso, pretendemos engajar as companhias brasileiras também nessa comunidade, com as universidades e também entre si, criando uma comunidade brasileira. Por último, queremos criar uma comunidade internacional, entre escolas brasileiras e internacionais e entre empresas brasileiras e estrangeiras. Como se vê, a agenda é muito ambiciosa.
Com certeza. O senhor já teve a chance de conhecer empresas brasileiras que estejam praticando inovação aberta? Poderia dar alguns exemplos?
Eu estive pela primeira vez no Brasil pouco mais de um ano atrás, quando conheci algumas empresas. Duas delas eu conheci melhor, Natura e Omnisys Engenharia (subsidiária da Thales, empresa francesa do setor de defesa), e elas pareciam muito interessadas no assunto, começando a desenvolver projetos específicos que iriam gerar alguns resultados úteis e interessantes. E agora eu encontrei as empresas muito mais interessadas e mais ativas, o conceito está começando a se tornar mais presente, parte do pensamento inovador dentro da empresa agora. Então, antes, um ano atrás, inovação aberta era uma ideia e uma experiência; agora já está madura para ser parte do processo nessas empresas.
O senhor acha que as empresas brasileiras têm muito que aprender, em termos de inovação, com as multinacionais instaladas aqui?
Eu acho que a economia brasileira está crescendo a partir de suas fortes bases naturais para uma base de conhecimento para a economia do futuro, que eu acho que vai dar uma prosperidade maior, melhores condições de vida para as pessoas, e aprofundar a integração entre o Brasil e a comunidade econômica global. Acho que as universidades e companhias brasileiras têm muito que aprender com as estrangeiras, e vice-versa. Veremos cada vez mais contribuições do Brasil para o mundo, é uma via de mão dupla.
Como economia emergente, em desenvolvimento, temos mais oportunidades de inovar do que as desenvolvidas?
Acho que uma das maiores vantagens que o Brasil tem é que as soluções desenvolvidas aqui podem ser exportadas para muitos países, que podem não ter condições de comprar tecnologias caríssimas do Japão e dos EUA, mas podem estar muito interessados nessas tecnologias do Brasil, que têm potencial até de estar mais de acordo com suas realidades, além de custar menos. É de países como o Brasil que virá a maior parte do desenvolvimento mundial nos próximos dez anos. O País está muito bem posicionado para atender bem a novas demandas e oportunidades de crescimento ao redor do mundo.
Que setores da economia brasileira podem se destacar no cenário mundial, em termos de inovação? Biocombustíveis, por exemplo?
Claro! Inclusive a ideia de usar carros bicombustíveis é daqui — e em qualquer hipótese, no futuro, carros não dependerão mais de fontes de energia não renováveis como as petroquímicas, mas de eletricidade e biocombustíveis e outras fontes de energia. E o Brasil já é um líder nessa área, não apenas em questão de tecnologia, mas também na sua aplicação. Por isso, acho que é um modelo promissor, que pode ser copiado por outros países também.
Quais são as maiores oportunidades de inovação para o Brasil?
Acho que o caminho do desenvolvimento para o Brasil é atrair mais investimentos em educação da população. Porque na medida em que a sociedade caminha de uma baseada em recursos naturais para uma sociedade do conhecimento, o padrão de conhecimento da população fica mais e mais crucial. Uma oportunidade posterior para o País seria atrair mais estudantes estrangeiros para conhecer a cultura local, para aprender português. O Brasil, como sociedade, é muito atraente. Então, acho que não seria nada difícil convencer as pessoas a virem. Agora, com a Copa do Mundo em 2014 e a Olimpíada em 2016, o Brasil ocupará um espaço cada vez maior na cena frontal do palco mundial. E essa é uma grande oportunidade para o Brasil, como também seria interessante enviar brasileiros ao exterior para estudar outros lugares. Essa circulação de cérebros do Brasil para economias mais desenvolvidas, e depois de volta ao Brasil de novo, é fundamental para fomentar a inovação.
Por que as empresas estão mais e mais interessadas em inovação?
Não por idealismo, mas por necessidade, pela concorrência e pela globalização, que vêm acabando com as possibilidades de imitação e passividade.
Por que inovação aberta?
A propriedade intelectual, ideia que ganhou força no século passado, vem sendo substituída pela colaboração na cadeia de valor, do começo da invenção até sua comercialização, é mais produtivo. Na verdade, não precisamos entrar em um jogo de tudo ou nada, a propriedade intelectual pode ser restrita à criação, mas desenvolvimento e venda podem ser compartilhados, por exemplo. Estudos realizados por grandes multinacionais como a Procter & Gamble mostraram que 90% das patentes desenvolvidas em seus laboratórios eram inutilizadas, não iam para frente, não geravam produtos nem serviços para serem comercializados. Por isso, a colaboração com outras empresas é importante. Mas a decisão da empresa vai depender do seu objetivo principal, se gerar receita ou distribuir seus produtos de forma mais ampla. Um bom exemplo é o setor de software. Já existem vários desenvolvidos e distribuídos de graça pela internet.
Como surgiu o movimento pela inovação aberta?
Os estudantes de universidades de ponta tiveram papel relevante. Muitos são contratados como estagiários de grandes companhias e são os grandes canais para troca de conhecimento entre ambas — escolas e empresas. As últimas descobriram que essa era uma maneira rápida e barata de ter acesso às grandes novidades pesquisadas em diversos campos da ciência. O surgimento das redes sociais (Orkut, Facebook, Twitter, LinkedIn) alavancou ainda mais a inovação aberta. Não é à toa que a maioria das empresas inovadoras estão no ramo de tecnologia. O problema, porém, é a falta de um modelo eficiente para geração de receitas.
Existe algum outro setor ou perfil de empresa mais apto, ou que esteja mais à frente no uso dos conceitos de inovação aberta?
A princípio, pequenas e médias empresas são as que começam o processo. O segredo da inovação aberta é a especialização, baseada em conhecimento. E agilidade também é muito importante.
Como ficam os departamentos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) nessa nova realidade?
Devem parar de brigar para ser os protagonistas de toda inovação e assumir um novo papel, assumir a responsabilidade de integrar, conectar os vários departamentos da empresa entre si e também conectar-se com empresas e universidades e departamentos de P&D de fora. Na verdade, a inovação aberta pode alavancar o P&D — e vice-versa.
– Léa De Luca
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